sábado, 16 de março de 2013

ROBERT SMITH

Ele influenciou Neil Gaiman e Tim Burton. Tanto Sandman quanto Edward, Mãos de Tesoura trazem características suas. No caso do cineasta, a influência vai além e chega até o seu próprio penteado. Os primeiros álbuns do The Cure foram fundamentais também para James O'barr durante a escrita do seu O Corvo. Toda a estética do que foi considerado sombrio ou “dark” passou por Robert Smith e sua banda, desde sua formação na década de 1970 e principalmente a partir do segundo álbum, Seventeen Seconds, em 1980, quando se fortaleceu a assinatura de Smith sobre a própria obra.

Compositor, vocalista e guitarrista, ele ainda foi baterista de Siouxsie & The Banshees, provando que esteve envolvido profundamente com o surgimento do pós-punk e faz parte do embrião do que se tornaria mais tarde o conceito de gótico, mesmo que, como muitos artistas do estilo, negue o rótulo. Seu cabelo bagunçado, o preto dos olhos e o vermelho borrado dos lábios são sua marca e o retrato de uma geração. Quantas pessoas a dançarem viradas para a parede no breu de um clube de rock alternativo não se vestiam e se sentiam como Robert, enquanto entregavam suas almas à tristeza de suas canções?

Junto com Morrissey e Siouxsie, Robert formava o que não é exagero chamar de “santa trindade” da melancolia. Os três ressoavam como os mais populares da cena dark, ainda que aderissem ao pop em alguns momentos. Ouso dizer ainda, por experiência própria, que os três despertavam uma especial admiração no público queer da cena.

Talvez, no caso de Robert, pela maquiagem. Mesmo na cena gótica, a pintura dos olhos, e sobretudo da boca, era uma transgressão. A “proximidade” com Morrissey (contemporânea, artística, de prestígio e comparação), sempre ambíguo, também pode ter influenciado. Mesmo que Robert seja casado há décadas com uma moça que conhece desde a juventude – o que, no fim, torna sua discreta transgressão em algo ainda maior.

Hoje Robert passa dos 50, mas mantém os cabelos bagunçados, o preto nos olhos e o vermelho na boca. Lançou com a The Cure treze álbuns até o momento, o último em 2008, 4:13 Dream. The Cure, aliás, sustenta, na opinião de muitos, o status de banda alternativa de maior sucesso do planeta. Como se não bastasse, volta ao Brasil após mais de dez anos no próximo mês para alguns shows.

Será uma boa oportunidade para reviver um sonho, uma estética. A melancolia tratada com respeito. Uma pena, apenas, que nem no Rio nem em São Paulo o show aconteça numa sexta-feira.

quinta-feira, 7 de março de 2013

CHORÃO

Eu gosto muito da voz dele. É uma das minhas preferidas desde que o rock virou adolescente e eu, adulto. É jovial e viril. Tem aquele ar moleque, de rua, ao mesmo tempo despojada e agressiva. É forte, grave, suja. No ponto.

Ouvi-lo cantar é como relembrar aquele garoto do colégio prestes a zoar o colega mais fraco e tímido. Aquele garoto de quem ninguém poderia escapar. Que ocupava os espaços, dominava os territórios e deixava sua marca. No cheiro, na pele, e no olhar. Que no fim da memória e da infância transforma o medo em libido, o ódio em desejo, a repulsa em atração, e ensina a vítima a erotizar o seu algoz.

Chorão era do skate, do hardcore, e do rap. E exercitava a feiura e a rouquidão. Um antigalã. Alguém “todo errado”, como cantava, que berrava a sua geração a plenos pulmões para impor o seu valor. Suas letras falavam de política, de amor, de desigualdade, e refletiram como poucas bandas de sua época o “sentimento jovem”. Não dá para lhe tirar o mérito de ter sido a juventude dos anos 90 e dos anos 2000. E das poucas formas autênticas de vida do rock comercial desse tempo. Personalidade era tudo o que o Charlie Brown Jr tinha.

Gente que busca o rock nos anos 80, 70, ou na cena alternativa ou independente, vê com restrições a obra de Chorão. Compreensível. Não é todo mundo que enxerga filosofia, rebeldia ou ativismo quando a linguagem muda tanto. As comparações se tornam injustas, ainda mais quando a banda de Chorão aceita suavizar seus riffs para se encaixar melhor na TV. Sem dúvida eles faziam mais e melhor do que na abertura da Malhação. Nos shows e nos lados B é que a essência aparecia. E o rock de verdade predominava.

Eu quase coloquei o “Alexandre” aqui na lista dos Hot Rock Bears, mesmo sabendo dos protestos que isto causaria. Ele foge dos padrões mesmo, e se colocou a anos luz de distância do universo gay. Mas como este espaço nunca foi de se submeter ao lugar-comum, sempre foi possível sua presença aqui, ainda mais hoje, ainda mais agora. E, como já foi dito, sua voz era forte demais.

Pensando nela, lembro de um momento da carreira do Charlie Brown Jr. Um show com a Vanessa da Mata que fizeram, dentro de um projeto de TV que visava misturar artistas de estilos diferentes. Simpático e safado, era delicioso ver como Chorão lidava com a cantora (“Mulher bonita e vagabundo sempre combinou”). E como sujava com sua voz, no sentido mais erótico possível, todas as canções.

Destaque para um momento em especial. Porque não dá pra resistir ao Chorão cantando “Do que ela gosta, eu tenho até demais”.

sexta-feira, 1 de março de 2013

TOM MORELLO

Ele é de Nova York e se descreve como o “Robin Hood negro da música do século 21”. A si ou a seu alter ego, The Nightwatchman, um roqueiro ativista que não conseguia se expressar politicamente com a banda que integrava até então, a Audioslave.

Parece inapropriado e inconcebível que um homem tenha de criar um projeto paralelo porque sua banda de rock não suporta um ativismo político, mas é a triste verdade desses novos tempos. Tom Morello, acostumado a se expressar com a Rage Against The Machine, precisou encontrar espaço.

Com um som mais voltado à música folk, The Nigthwatchman chegou a ser comparado a Bob Dylan e, primeiramente sem intenções comerciais, lançou seu primeiro single, No One Left, na coletânea Songs and Artists that Inpired Fahrenheit 9/11, que reuniu nomes que o cineasta Michael Moore ouvia enquanto criava o polêmico documentário sobre a invasão americana ao Afeganistão, após os atentados de 11 de setembro de 2001.

As guerras após o famoso atentado foram o que inspiraram também Tom Morello, que criou seu alter ego com o intuito principal de cantar as mazelas sofridas pelo povo consequentes desse episódio e os crimes de guerra que se seguiram. The Nightwatchman possui até o momento quatro álbuns. O mais recente é de 2011, World Wide Rebel Songs.

Tom, considerado um dos cem maiores guitarristas de todos os tempos pela Rolling Stone, ficou mais conhecido, entretanto, por sua atuação com a Rage Against The Machine, banda de “Rap Metal”, estilo cujo nome já diz tudo e que é uma das raízes do nu-metal. O RATM quase não precisa de apresentação. Tornou-se símbolo de um novo tipo de rock fortalecido na década de 1990, somando peso e prestígio, e boa parte deste justamente pelo ativismo político de suas letras, sempre engajadas a abordar os problemas da desigualdade social. Seu maior sucesso, Killing The Name, do primeiro álbum de 92 e do refrão “And now you do what they told ya”, é hino de uma época.

A banda sofreu uma pausa nos anos 2000 com a saída do vocalista Zack de La Rocha, e o restante da banda, incluindo Tom, formou com Chris Cornell a “não ativista” Audioslave, que já acabou. A RATM retomou as atividades em 2007 em shows inspirados pela indignação contra George W. Bush e Tom Morello finalmente reencontrou o seu espaço.

Sua necessidade de atuar politicamente é tanta que Tom até fundou a ONG Axis Of Justice, em parceria com Serj Tankian, do System of a Down, com o objetivo de unir músicos e fãs para lutar pela justiça social. O projeto costuma ter uma tenda em festivais onde as bandas dos moços tocam e também um show mensal transmitido pela rádio. O projeto lançou ainda um álbum ao vivo, chamado Axis Of Justice: Concert Series Volume 1, com a participação de outros músicos como Flea, Pete Yorn e Chris Cornell.

Sempre discreto, escondido geralmente em um boné, Tom Morello fez história com sua guitarra. Não tem a presença de palco dos dois frontmen que acompanhou pela carreira, mas não consegue esconder o charme quando decide soltar a voz. Muito menos quando a luz revela alguns botões abertos de sua camisa. E pensar que até outro dia este espaço custou a achar um galã negro significativo dentro do rock...

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